Descrição para cegos: foto mostra os rostos de 3 crianças indígenas do Chile, tendo na cabeça faixas enfeitadas com desenhos típicos da sua cultura amarradas em torno das cabeças. |
Com base em relatório da Unicef, o qual
afirma que 40% das crianças no mundo não têm acesso a educação em sua língua
materna, a jornalista Adélie Pojzman Pontay apresenta
situação enfrentada pelos povos mapuche e mapudungun, no Chile. O respeito à
língua materna é um direito humano e necessário à preservação das culturas
anteriores à colonização, assim como, a toda a diversidade cultural. Tal
situação não é só enfrentada no Chile, como nos demais países da América
Latina. Contudo o ensino na língua materna, por si só, não é o suficiente,
sendo necessário ações efetivas para a manutenção da cultura em geral (Tiago
Bernardino).
Unicef:
40% das crianças não têm acesso a educação em sua língua materna
Adélie Pojzman Pontay – traduzido por
Tiago Bernardino
Trata-se de uma situação que, segundo
vários especialistas, não apenas causam discriminação. Também impede o bom
desenvolvimento dos meninos e meninas afetados. No Chile, o caso dos mapudungun
e do povo mapuche, é um exemplo claro.
O Fundo das Nações Unidas para Infância (Unicef) anunciou esta semana que 40% das crianças no mundo não têm acesso a educação em sua língua materna ou em uma língua que eles não compreendem ou falam. Segundo um estudo anterior, 221 milhões de pessoas se encontram nesta situação, principalmente em lugares que há uma grande diversidade linguística.
O relatório notou que esta situação
impede que as crianças tenham uma base sólida para ler e escrever. Também
fortalece fenômenos de exclusão social e de pobreza, em particular quando esta
discriminação está vinculada a certas etnias.
"No Peru, a diferença nos resultados dos testes entre as crianças indígenas e não-indígenas na segunda série já é
considerável e crescente. Em
2011, os falantes de espanhol foram
mais de sete vezes mais propensos
do que os falantes de línguas
indígenas para alcançar níveis
satisfatórios na leitura ",
diz o relatório.
Quando uma criança não pode estudar em seu próprio
idioma, ele não apenas se atrasa academicamente. Também o sistema o comunica
que sua língua pode ser um vínculo de sabedoria. Quando a sociedade não apoia o
uso de uma língua está dizendo: este idioma não serve, não tem valor.
“Em países multi-étnicos, por exemplos, a imposição de um
único idioma dominante, como o idioma ensinado nas escolas, é decidido, muitas
vezes, por necessidade. E com frequência tem sido um motivo para reivindicações
e conflitos ligados com temas mais amplos relacionados a desigualdade social e
cultural”, acrescentou.
O direito línguístico faz parte dos direitos humanos
fundamentais. No Chile, a luta dos povos indígenas, em particular os mapuches,
por este direito linguístico, não foi resolvido. A maioria dos alunos falam
casteliano, no entanto o problema não é receber uma educação em sua língua
materna, mas sim lutar contra a homogenização da sociedade chilena para
proteger a herança de seu povo.
Elisa Loncón, especialista em educação intercultural da
Universidade de Santiago do Chile, que também trabalha na Rede pelos Direitos
Linguísticos e Educativos do Povo Mapuche, explicou: “Há um sistema educativo
colonial e generalizado onde os indígenas não têm espaço. Obviamente transforma
a mente dos povos indígenas e tem o sentido de assumir que eles não valem a
pena. Porque no fundo o sistema educativo é um sistema de reprodução de um
sistema dominante”.
“Quando o Estado Chileno começa a implantar suas instituições
dentro do território mapuche, e assim chilenizá-la em definitivo, e implantam
uma política de educação em casteliano, tira o povo mapuche de seu idioma.
Então se forma uma situação política onde o Estado chileno buscou homogenizar
toda a população”, acrescentou Danko Marimán, porta-voz da oficialização dos
mapudungun em Araucanía.
Na sexta-feira, 21 de fevereiro, Dia Internacional da Língua
Materna, Marimán e outros ativistas organizaram uma caminhada familiar para
pedir a oficialização dos mapudungun a nível regional.
Com o decreto 280 de 2009, se concretizou a implementação
da educação intercultural no Chile. Segundo o Ministério da Educação (Mineduc),
que administra este programa, no ano de 2014 havia 50 mil estudantes em 1.270
escolas por todo o páis, que se beneficiaram de uma alguma forma do programa
intercultural.
“Esta cifra corresponde ao total de matrículas dos cursos
que ingressam notas da disciplina Setor de Língua Indígena no Sistema Geral de
Informação de Estudantes”, explicou Vadim Vidal, da Direção de Comunicação do
Mineduc.
Esses programas podem ser o ensino de uma língua indígena
como disciplina, em uma oficina ou programa de “revitalização e desenvolvimento
cultural e linguístico”. Também há 482 educadores financiados pelo Estado.
Este decreto exige que as escolas que tenham 20% de seus
alunos autoidentificados como indígenas, lhes deem acesso a programas
interculturais. Sem embargos, um dos problemas da implementação é que cerca de
70% da população indígena vive em zona urbana, onde quase nunca há uma
concentração tão alta. Por exemplo, 30% do povo mapuche vive na região
metropolitana de Santiago, a segunda taxa mais alta depois de La Araucanía.
Segundo o Mineduc, existem 40 programas interculturais
nesta região, 6 disciplinas e 34 oficinas interculturais. Na comuna de Puente
Alto, que tem a maior quantidade de mapuches na capital, com quase 15 mil
segundo o senso de 2002, asseguram que não existe nenhum programa deste tipo em
suas escolas. Em La Pintana, onde há mais de 11 mil mapuches, a única oficina
que existia em toda a comuna, no colégio Juan de Dios Aldea, não vai continuar
este ano por falta de interesse.
Para Elisa Loncón, o formato do ensino de linguas
indígenas também é um problema, porque é apenas uma disciplina com duração de 3
horas por semana.
“A língua mapudungun não cumpre todas as funções sociais:
não é a língua da administração, não é a língua da política, não é a língua da
cultura, não é a lingua dos meios de comunicação. Então, o que significa isso?
É preciso se desenvolver todas essas funções sociais da língua mapuche para que
realmente funcionem em iguais condições com o espanhol”, exigiu a professora.
Além disso, explicou a situação dos educadores
tradicionais não ajuda. Segundo ela, não são como os professores,uma situação
que os mantém em precariedade, especialmente em áreas rurais. Tampouco lhes dá
o mesmo respeito frente aos alunos.
“Um escola com uma educação intercultural bilíngue
deveria ser uma escola transformada estruturalmente, onde todos os professores
tenham uma valoração de diversidade, tenham uma valoração das raízes dos povos
originários”, acrescentou.
Para ela, a última etapa desta estrada é completamente "fora"
de conversa. Que é a educação intercultural para todos. "Em todo, o sistema escolar deve atender
a um sistema de discriminação
que tem caracterizado o sistema ao longo da história”.
A oficialização das línguas originárias, ao menos a nível regional, poderia
compensar essa história dolorosa.
“Quando nós estamos pedindo a oficializaçaõ dos mapudungun, não estamos
dizendo em nenhum momento que o casteliano não vai mais ser falado ou que os
falantes de casteliano vão ser castigados e discriminados como foram os
falantes de mapudungun em seu momento. Ao contrário, cremos em uma sociedade
bilíngue, que se aceite em espaços de tolerância onde convivem dois povos”,
explicou Mariman.
Maria Lara Millapán, uma professora da Universidade Católica de Villarica,
que escreve sua tese de doutorado sobre o ensino de mapudungun, é mais
otimista. Isto, ao destacar o caso da comuna de Galvarino, em La Araucanía,
onde o mapudungun é língua oficial desde junho de 2014.
Publicado em: http://radio.uchile.cl/2016/02/28/unicef-40-de-ninos-no-tiene-acceso-a-educacion-en-su-lengua-materna em 28 de
fevereiro de 2016.
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