quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

São Paulo cidade linda ou cidade cinza?


Descrição para cegos: fotografia dos grafites de alguns artistas de rua e dois carros passando na Avenida 23 de maio.
Por Priscila Monteiro

Um dia após tomar posse do cargo de prefeito da cidade de São Paulo, João Doria lançou o programa “São Paulo Cidade Linda”, que tem o objetivo de revitalizar a capital paulista através de 24 iniciativas que incluem a manutenção, o reparo e a limpeza de ambientes públicos, segundo o site da Prefeitura.
O programa gerou polêmica ao propor “limpar” a arte de rua das principais avenidas de São Paulo. Nas ações já realizadas na Avenida 9 de Julho e na Avenida Paulista Doria participou vestido com o uniforme de gari. E na ação realizada na Av. 23 de Maio, Doria, que também esteve presente no local, mandou cobrir de cinza trechos da avenida sob a justificativa de que as pichações foram cobertas porque estavam "envelhecidas demais ou mutilada por pichações".
A avenida era considerada o maior mural de grafite a céu aberto da América Latina, com 15.000 m². O acervo cultural do local foi encomendado pelo ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, e contava com obras de 200 artistas, entre eles, Os Gêmeos, Nina Pandolfo e Zefix, grafiteiros renomados, que possuem obras até em paredes de outras nações. No ano passado, Os Gêmeos realizaram em Nova York a exposição “Silence of the music”, que contou com a presença de mais de mil pessoas na inauguração, de acordo com o site oficial d’Os Gêmeos.
Desde o começo de sua gestão, o prefeito paulista tem dado declarações autoritárias e normativas contra pichações. Em reforma da ponte Estaiada, mandou recado aos pichadores, convidando-os a mudar de profissão. E nesta “Guerra contra o spray” propagada por João Doria, o nome “Cidade Linda” nos traz um questionamento: a cidade vai ficar linda pra quem? Afinal, não existe unanimidade em relação à conceituação da arte de rua como feia ou bonita.
Esse título impositivo também propaga o estereótipo que associa essa forma de arte ao crime de degradação do patrimônio, equívoco já corrigido pela lei n. 12.408/2011 que descriminaliza a pichação desde que tenha o objetivo de valorizar o patrimônio público, ou, quando feita em lugares privados, autorizada pelo proprietário do muro.
Enquanto o prefeito declara “repúdio aos pichadores”, o artista de rua vive a dualidade de ser o pintor inspirador para os admiradores de arte e o destruidor da cidade, como descreveu João Doria em discurso sobre a pichação. E o cinza seguirá cobrindo as ruas de São Paulo.

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