quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Muniz Sodré e a diversidade

Foto: Divulgação 

Temos o costume de tentar definir e delimitar um sentido para tudo, porém esquecemos que nem tudo pode ser descrito e, muitas vezes, é mais importante sentir do que tentar entender. A diversidade humana é algo a ser mais sentida do que entendida, segundo Muniz Sodré, no texto abaixo. (Nathalia Correia)

Educação para o diverso  
Muniz Sodré* 
A diversidade que emerge na globalização contemporânea traz elementos novos para o pensamento. O espírito conservador pode não pensar desta maneira, por considerar que, na medida em que desaparece do horizonte social a ideologia da emancipação e em que o futuro perde o seu contorno utópico, o passado entraria em cena a serviço de uma diversidade cultural de coloração étnica, introduzida pelo discurso multiculturalista. Para o senso comum de língua inglesa, o diverso é apenas “ethnic”. 
Isso é, na verdade, uma simplificação de fundo iluminista. O diverso não emerge historicamente sob o beneplácito paternalista do multiculturalismo, e sim em virtude da movimentação de grupos sociais que trafegam política e educacionalmente no espaço dos direitos civis e humanos.
Sob as aparências carcomidas da política tradicional, existe uma dinâmica social em busca de formas novas de expressão, em que avulta no primeiro plano o jogo existencial da diversidade. O que isso traz de novo para o pensamento e para a educação? Para começar, o interesse de agir a partir da dimensão espacial, que tem a ver com a aproximação dos seres e com o sentir. A diversidade humana é algo a ser mais sentido do que entendido. 

Os homens, seres singulares, coexistem espacialmente em sua diversidade. Cada uma dessas singularidades corresponde, às vezes, à dinâmica histórica de umOutro, um coletivo diverso. Na prática, aquilo que nós experimentamos de uma cultura, principalmente da nossa, é a diversidade de seus repertórios, onde se mostram hábitos, enunciados e simbolizações. Apesar das transformações na organização do mundo e nas formas de poder, as populações sul-americanas mantêm a especificidade de suas formas de simbolizar e representar o real, levantando questões importantes para a coexistência das diferenças humanas. 
O olhar hegemônico do clássico “narrador de histórias únicas” é confrontado o tempo inteiro com a pluralidade de formas pelas quais as culturas dos grupos e sociedades encontram sua expressão. Uma iniciativa que vise, por exemplo, a ampliar o conhecimento e a compreensão da história da população negra brasileira e da África tem efeitos de contra hegemonia cultural e educacional. 
Pôr compreensão ao lado do conhecimento é fazer do sentimento a lupa assestada sobre a diversidade: para além do mero registro intelectual das diferenças. Educar também pela dimensão do sensível é produzir a consciência que leva à aceitação e à aproximação com o Outro. Como bem assinala o romancista Caio Fernando Abreu, “é fácil não dizer; difícil é não sentir. A educação para a diversidade implica, na verdade, tornar-se plural em si mesmo, ao modo sugestivo de Fernando Pessoa: Sejamos plurais como o universo!”.

*Muniz Sodré é jornalista, sociólogo e professor de Comunicação na Universidade Federal do Rio de Janeiro. 

Fonte: www.acordacultura.org.br com modificações. 

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